Este é o Miscelânea, por Júlio Lucas

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quarta-feira, 2 de março de 2011

NOTAS DE VERÃO - 1ª PARTE

VERÃO AUSTRAL E O REI MOMO DE VERDADE - O Horário Brasileiro de Verão terminou na semana passada, mas nosso verão austral permanece até lá pelo vigésimo dia de março, na fácil promessa de garantir a permanência do calor até depois da festa de Momo. 
Felizmente a folia geral, que se demorou mais do que de costume este ano, chega no próximo final de semana trazendo de volta às ruas a figura tradicional do rei gordo de alegria.
Nos últimos quatro anos, a escolha do comandante da festa momoesca estava mais parecendo o ato solene de concessão de comenda a celebridades. Em 2010 vazou na imprensa que a esposa de Pepeu Gomes, o homenageado da vez, teria proibido a Rainha do Carnaval de subir no trio ao lado do seu marido. 
Essa deve ter sido a gota d’água para a volta da tradição. Nesta quinta-feira (3) o secretário administrativo Edgar Passos (108 kg) - um pouco mais gordinho que seu antecessor - eleito e coroado Rei Momo ao vencer 13 concorrentes no sábado (19), receberá a chave da cidade das mãos do prefeito João Henrique. 

VERÃO - DIVERSÃO PARA UNS, TRABALHO PARA OUTROS - Contrariando a máxima que diz que no Brasil o ano só começa depois do Carnaval, Salvador está em polvorosa. Engarrafamentos a toda hora, praias cheias, bares e restaurantes vendendo seu peixe. Só o metrô, pré-inaugurado antes das eleições passadas que ainda não andou um metro. 
O motivo da euforia é que comerciantes, empresários e outros profissionais nesta estação trabalham dobrado para multiplicar os ganhos fazendo a alegria dos visitantes e de soteropolitanos de folga (além dos folgados, é claro). 

COBERTURA ONLINE - Quem também trabalhou bastante na alta estação foi o pessoal do Canal BA (www.canalba.com.br). Acompanhei os bastidores da primeira transmissão via TV web da festa do Bonfim por mais de quatro horas ininterruptas ao vivo, para o mundo. 
A partir de uma base montada na belíssima sede da Associação Comercial da Bahia, no comércio, com câmeras digitais, ilha de edição e parafernália de fios, uma competente equipe de técnicos e jornalistas fez a cobertura de tudo que aconteceu na sincrética festa que, em participação popular, só perde para o Carnaval. 
O convite veio de Luiz Moura, mercadólogo que juntamente com seu sócio vem investindo no projeto Canal Ba. Conheço Luiz dos tempos que produzíamos o Sinal Vermelho, banda de rock composta por quatro irmãos, que tocou para grandes públicos nos anos 80 em Salvador. 
Ao ser entrevistado por Rada Rezedá, no encerramento da transmissão, Luiz lembrou do “Muito Prazer”, programa televisivo que realizamos em parceria com o admirável Álvaro Guimarães, exibido pela CNT/Aratu, no início dos anos 90. Foi a primeira vez que uma produção local entrou em rede nacional. 
Jornalista e personalidade no teatro e cinema baianos, Álvaro foi assistente de direção no primeiro filme de Glauber Rocha, Barravento, e responsável pela primeira apresentação de Caetano Veloso em público. Ao tempo em que aprendíamos com ele se auto-dirigindo na condução das filmagens, a gente se desdobrava na produção e roteiro para levar ao ar o programa semanal

FOTO: FERNANDO VIVAS, DO BLOG "OLHO DA RUA".
ALEGRIA DAS BAIANAS - Fui à Colina Sagrada. Não a pé, no dia da festa. Bem que eu queria ter a disposição de meu cunhado e do filho, que por fortes razões foram cumprir uma promessa em meio àquela multidão. 
Fui em outra oportunidade em um tour para apresentar a Cidade Baixa à Lana. Tomamos sorvete na Ribeira e não faltaram lembranças do Bonfim  para as sobrinhas dela. 
Em frente à igreja, a baiana do acarajé não continha o entusiasmo ao revelar a charada dos bons negócios: “(...) as vendas tão boas, meu filho... é que o verão esse ano, com o Carnaval em março, ficou mais longo. Aí dá pro povo ter fôlego e gastar mais por muito tempo”. 
Mais adiante, do alto do Elevador Lacerda era possível ficar a ver navios desembacarem turistas a rodo no Terminal da França. Em outro momento, um taxista festejou: “Este ano? Com certeza está melhor que o ano passado, moço”. 


DESBOTADO - Mas nem tudo na cidade do axé é alegria, fantasia e cor. Deparar-me com as fachadas desbotadas, iluminação precária e pouca segurança nas ruas do Pelourinho, foi uma triste constatação de que as notícias de tantos casarões históricos que desabaram em 2010 na capital baiana não aconteceram por acaso. Foi por descaso mesmo. 
Pensei em assistir ao show do Cascadura no Pelô. Mas na programação daquele fim de semana constava a Banda Didá na Praça Teresa Batista, que além da homenagem a Neguinho do Samba, não decepcionou com um repertório mais eclético do que eu poderia imaginar. Muito funk, MPB e pop-rock, além dos tradicionais sucessos da música baiana animaram a platéia. 

AVENTURA - Numa noite de fim de semana, necessitar dos serviços da estação da Lapa - terminal rodoviário por onde transita quase meio milhão de passageiros ao dia – pareceu-me vivenciar aqueles filmes de guetos urbanos: má iluminação, péssima sinalização, lixo e desmando, emanavam a sensação de total insegurança no que parecia um mundo sem Lei. Só a trilha sonora que causava estranheza (ou não). O pagode ao vivo comia solto no centro. 

CAMINHADA COM OBSTÁCULOS - Caminhei na Orla. O Jardim de Alah continua lindo. A iluminação está legal, mas temos que manter distância de fiações elétricas expostas na grama. Ano passado um cachorro perdeu a vida e um rapaz perdeu um dedo em acidentes desta natureza. 
Ainda se vê alguns ciclistas transitando na via de pedestres e vice-versa. Será que ainda não entenderam a sinalização? Mas surpresa mesmo foi me deparar com um automóvel atravessado, parado sobre as vias exclusivas de pedestres e ciclistas. Me pareceu ter sido um funcionário de uma empreiteira que estaria fazendo obras nas imediações do Aeroclube dando uma estúpida demonstração do poder provisório que o cargo lhe conferira. 

NOVA VELHA ORLA - Sem as barracas, as praias poderíam estar mais bonitas e organizadas. Mas os ex-barraqueiros, que não puderam comprar um imóvel do outro lado da pista para reerguer seu negócio, fixaram-se ao lado dos ambulantes e espalharam caixas de isopor, tendas, sombreiros e cadeiras para aluguel. Em meio ao improviso geral não há lugar para preocupação com limpeza. Favelizou de vez, como previ em artigo postado na época das demolições.

MALANDRAGEM NÃO DÁ UM TEMPO - Nos tradicionais bares e botecos dos bairros, a descontração é comedida à medida das horas. “Não há mais sossego. A malandragem está solta. Outro dia ladrões levaram o carro de um senhor, ali do outro lado. O dispositivo de segurança interrompeu o veículo mais à frente e os caras voltaram para matar o dono na frente de todos”, desabafou um amigo. 

AVANÇO IMOBILIÁRIO – Curti com tranquilidade ao lado dos meus filhos, Caíque e Caio, no Clube do Baneb, no Costa Azul. Lá pude reunir com alguns familiares. 
O vasto complexo esportivo dotado de restaurante, salão de festa coberto, campo de futebol, quadras, piscinas e área verde, resiste (não sei por quanto tempo),  espremido entre a imponência de prédios modernos, à especulação imobiliária em um dos endereços que mais valorizam atualmente em Salvador.
Torres, condomínios e asfalto avançam a passos largos sobre antigas casas, e engole o que resta das dunas e da mata-atlântica na região norte de Salvador. Muita gente está mudando de ramo para ingressar no promissor negócio de venda de imóveis, outros encontram neste setor uma alternativa para entrar no mercado de trabalho. 
Enquanto isso, saguins nos fios de alta tensão, camaleões em telhados e pássaros excêntricos enfeitam nossos olhos, vindo se alimentar e fazer seus ninhos pertinho da gente. Tão belo cenário é a triste certeza de que animais silvestres estão adquirindo perigosos hábitos urbanos para não morrer de fome. 
Soube que até um jacaré foi encontrado dentro de uma concessionária de veículos.

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