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sábado, 19 de janeiro de 2013

OUTRO OLHAR: Metacrítica (por Miguel Mensitieri)


Estreamos a temporada 2013 do MISCELÂNEA com uma velha novidade: a exemplo do espaço PAUSA PARA POESIA,  que pontua frequentemente este blog com trabalhos poéticos de autores diversos, resolvi também publicar crônicas e artigos críticos, que nem sempre refletem a opinião da nossa editoria mas levantam questões relevantes sobre assuntos variados. 
Pois bem, assim inaugura nosso OUTRO OLHAR, com seu artigo crítico sobre a crítica intitulado Metacrítica, o controvertido cronista, poeta e contista Miguel Mensitieri, autor do livro recentemente lançado Planos Entrelaçados.
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A indolência mental paralisa a vontade de ir além de uma estrutura simples, obriga a uma leitura de fácil assimilação apoiada no previsível e estratifica a percepção. É sempre bom navegar fora da ordem (sensação de descobertas), ir ao encontro de uma perspectiva caótica e, se possível, ordenar noutro nível tal desordem.
Críticos incipientes colocam a objetividade como principal condição para que se compreenda clara e simplesmente uma mensagem; eles não percebem a semente do dogma que germina e se instala na raiz dessas opiniões carentes de fundamentos teóricos e que respiram sob o signo do achismo – neologismo em ascensão.
Li um texto em que o autor condena com certo ranço de preconceito e em tom depreciativo alguns escritores que brincam com as palavras (os cordelistas adoram tal exercício criativo), rotulando-os de pretensos eruditos que se perdem em divagações subjetivas, produzindo textos vazios e herméticos. Ele não percebe que sem pretensão não se faz literatura. Quem mais pretensioso que Waly Salomão? E nem por isto deixou de produzir uma arte reconhecida e festejada. Quem mais pretensioso que o poeta português Fernando Pessoa que, por sua indiscutível universalidade, dispensa apresentação. Pretensão é vontade de ultrapassar limitações e isto se faz com muito trabalho. De uma pretensa erudição se abstrai importantes conhecimentos, num país sem educação de boa qualidade.
O autor afirma que o palavrório usado por muitos comunicadores não passa de uma tentativa de sobrepor ao comunicado conhecimentos que julgam possuir, com pretensa erudição. Nada se perde em literatura. O palavrório poderá ser transformado em texto cômico-satírico. Vitor Hugo é visto por alguns estudiosos como gênio literário, é autor de uma prolixidade imagética e lexical de encher os olhos e o saco, não obstante forte apelo social de seus romances. Não é grande a distância entre palavreado e prolixidade. O leitor inteligente e maduro é rápido na identificação de uma ironia.
Toda boa literatura deve, em determinado momento, envolver-se com o hermético, e todo grande autor navega meandros subjetivos. Não desprezo supostos “pretensos eruditos”, respeito-os por sua ousadia ao tentar buscar tal condição intelectual. Quantos eruditos existem no Brasil? Talvez dez, ou pouco mais que isto. Digo erudito no sentido mais amplo do termo. Devo salientar que não sou advogado dos milhões de “pretensos eruditos” desprezados pelo autor de “Crítica aos Críticos”. Prefiro um artista criativo sem erudição, a um grande erudito de frágil criatividade, ou nenhuma. Os cordelistas, quando não analfabetos, são limitados em gramática e outros conhecimentos, mas nos abrem páginas poéticas de grande beleza, no contexto da poesia popular. O genial Graciliano Ramos foi chamado de ignorante por importantes críticos e escritores do seu tempo.
Meu caro e bem intencionado articulista, ao citar Sócrates você deixou de acrescentar algo MAIS: ele sofisma ao dizer que “o que sei é que nada sei”. É um sábio que viaja ironicamente nas asas da modéstia e da humildade, no sentido de minimizar sentimento e convicção de superioridade; destarte, do alto de sua sabedoria proclama a fragilidade do gênero humano, sua pretensa insignificância, face à incomensurável grandeza do universo.
Tenho fácil interpretação para a expressão socrática “o que sei é que nada sei“. Se alguém sabe que nada sabe, já sabe alguma coisa, ou seja, sabe que nada sabe. Isto é lógica paradoxal. Sócrates é conhecedor de tudo que há em nada e de nada que existe em tudo.
É preciso fazer amor com o signo literário, ou jamais haverá simpatia e empatia entre leitor e texto à luz de cada parto.

Salvador, 25 de dezembro 2012.
Miguel Mensitieri.

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